
Cidade baiana que carrega memória indígena, cultura popular e força operária. Assim é Camaçari, quarto município mais populoso do estado e o segundo mais populoso da Região Metropolitana de Salvador. Neste ano de 2025, completando 267 anos de emancipação política e muita história, Camaçari celebra o tempo, as conquistas e, sobretudo, o povo de alma aguerrida, os rostos que moldaram e continuam moldando a identidade camaçariense, e que fazem desta terra um lar de raízes profundas, onde o passado pulsa presente.
Com início datado em 1558 às margens do Rio Joanes, Camaçari tem como berço Vila de Abrantes, através da fundação da Aldeia do Divino Espírito Santo. É nesse coração ancestral que vive Rivonildes de Jesus da Silva, 46 anos, reconhecida na Aldeia Tupinambá de Abrantes como Magé Rivia Tupinambá. Olhos fincados no futuro e firmeza de quem carrega gerações, ela rememora marcos iniciais na história do município.
“Nosso povo tupinambá, de resistência e de luta, é a história da Camaçari marcada por ancestralidade, acolhimento, justiça e também pela mistura de povos negros, de cultura, de fé. Quando eu falo de mim, eu falo de Camaçari. Quando eu falo de Camaçari, eu falo do meu povo, do respeito ao bioma. Eu sou uma mulher bioma e restinga, e tudo isso é a consistência de Camaçari”, afirma Rivia, mãe atípica, artesã e escritora.
A ascendência tupinambá provém do avó José Florentino, o Zé Fulô, e do pai Geraldo Florentino da Silva, mais conhecido como “Matias”. Mãe de duas meninas, uma delas portadora de necessidades especiais (PCD), Rivia lembrou que atualmente 26 famílias constituem a população tupinambá originária. Para o futuro, ela almeja ressignificação.
“O desejo é fomentar o conhecimento cultural sobre o nosso povo. Levar para a realidade pedagógica das nossas crianças e jovens o pertencimento, a identidade indígena e tupinambá da cidade. Quem é de Abrantes sabe que Camaçari nasceu aqui e precisamos expandir essa compreensão cada vez mais. Dessa maneira, nosso legado se mantém vivo e respeitado”, acrescentou Rivia.
Saindo de Abrantes e chegando à sede municipal, Jandira da Conceição, 94 anos, traz marcas de outra versão do tempo, mas com a mesma força de quem faz história na cidade. Natural de Mata de São João e coração rendido por Camaçari, a aposentada retrata o orgulho de ter criado os cinco filhos no município e, agora, a alegria de poder contemplar os nove netos – entre eles o cantor, compositor e percussionista Danrlei Orrico (O Kanalha) – e sete bisnetos, representarem o futuro da localidade. “Essa cidade me acolheu. Aqui criei minha família”, contou.
Em linhas culturais, Jandira é uma das guardiãs do samba de roda e da religiosidade católica na cidade. De lavadeira e vendedora ambulante a ex-funcionária da Escola São Thomaz de Cantuária, nos meses de junho, a aposentada abre as portas de sua residência para realizar a trezena de Santo Antônio – tradição que mantém há mais de 70 anos.
“Me sinto muito feliz de ver a casa cheia. Aqui o povo reza, dança, come, brinca, faz seus pedidos e agradece pela vida. Eu amo Camaçari e amo tudo que consegui construir por aqui”, endossou.
Na mesma cadência de tempo, Virgulino Alves, 93 anos, testemunhou o crescimento vertiginoso de sua terra. Filho de Camaçari, o aposentado trabalhou no Polo Petroquímico quando a cidade ainda aprendia a lidar com o futuro industrial pujante que se aproximava. Pai de 18 filhos, avô de 38 netos e bisavô de 28 bisnetos, ex-operário é parte da geografia afetiva de Jauá, Jacuípe e da sede, onde mora atualmente.
“Essa cidade era outra. Tem horas que paro e fico lembrando como tudo está diferente. Bate saudade, é muita gente, muito carro e coisas novas que eu nem sei usar, mas também fico feliz de ver aquele Polo Industrial que eu trabalhei antigamente, hoje, tão grande. Só rezo que o futuro seja bom para essa cidade e para todos, com oportunidades, como foi um dia para mim”, disse.
Em junho, o Polo Industrial de Camaçari completou 47 anos de existência. Primeiro complexo integrado do setor petroquímico no Hemisfério Sul e marco da industrialização no Nordeste, o polo camaçariense é um pilar fundamental para a economia baiana, respondendo por cerca de 22% do Produto Interno Bruto (PIB) da indústria de transformação do estado. São mais de 80 empresas atuantes, responsáveis em movimentar cerca de US$ 15 bilhões anuais.
E se cada canto de Camaçari tem uma voz que ecoa representatividade, a Aldeia Hippie de Arembepe é lembrada por Álvaro Figueiredo Machado, 87 anos. Ex-bancário, ele é um dos integrantes mais antigos do local, que surgiu no final da década de l960 e é considerado símbolo de liberdade, arte e conexão com a natureza, além de ter projetado Camaçari para o mundo.
“Eu vi aquele lugar nascer. Na época, era bem novinho, já trabalhava como bancário e tinha viajado alguns locais do mundo. Mas, foi quando retornei de Machu Picchu, no Peru, que decidi viver mais intensamente a energia da aldeia de Arembepe. De lá para cá, só tenho amor por lá”, compartilhou Álvaro.
Presentemente, o aposentado se divide entre a moradia em Caldas do Jorro, na própria Aldeia Hippie de Arembepe e na casa do irmão mais novo, no bairro do Alto da Cruz. Pai de um filho e avô de uma neta, Álvaro é ponte entre o urbano e o natural.
“Espero que a Aldeia nunca acabe. Ali é um dos patrimônios de Camaçari e preserva a filosofia do movimento hippie de todo mundo há décadas. Aquele chão já recebeu Janis Joplin, Mick Jagger, Roman Polanski e Rita Lee”, complementou.
Em meio aos relatos, Camaçari segue expandindo como cidade que acolhe, forma e transforma. Cada rosto que habita, trabalha, ama e sonha, é parte indissociável da história que continua sendo escrita com alma, luta e coração.
Fonte: Prefeitura de Camaçari