Uma manifestação de fé, mas de uma maneira nada ortodoxa, o Bando Anunciador da Festa de Senhora Santana decorre, segundo relatos, de igual tempo ao início do festejo religioso. Por ser considerado profano, foi extinto pela Igreja na década de 1980, retornando com força, e hoje há quem o classifique como ‘uma segunda micareta’.
Um dos mais importantes eventos religiosos da Bahia, que procede, ao que se fala, do início da formação da cidade, embora faltem dados sobre o seu exato começo, a Festa de Senhora Santana, padroeira do município, ocorre no mês de julho, com a realização de novenas e data magna no dia 26. Durante muito tempo foi marcada não apenas pelos atos formais do credo católico, que incluem a majestosa Procissão de Senhora Santana, que encerra a programação festiva, mas também pela parte considerada profana, de todo modo igualmente relevante por se tratar de uma forma de manifestação da comunidade, ainda que não tão ortodoxa, mas de acordo com o espírito festivo popular.
Um desses elementos é o denominado Bando Anunciador, responsável pela divulgação prévia do evento, como se fosse um grande anúncio nos meios de comunicação. No início, o Bando saía sempre no primeiro domingo do mês de janeiro, às primeiras horas da manhã. Centenas e centenas de pessoas participavam alegremente do desfile pelas ruas centrais da cidade ao som de bandinhas de sopro ou fanfarras, geralmente regidas pelos maestros Miro e Braga. O bando, na verdade, tinha uma expressiva força no bairro dos Olhos D’Água, onde a Família Belmonte era a organizadora, congregando grande parte dos moradores do local. Contudo, devido à dimensão da cidade princesa, em sua rápida evolução urbana, foram surgindo outros núcleos, entretanto com o mesmo objetivo e o mesmo modelo estético/decorativo.
No sábado, véspera da saída do bando, no local escolhido do bairro, era feita uma iluminação feérica com gambiarras. A área toda era enfeitada com bandeirolas multicoloridas, os postes da rede elétrica decorados com palhas de coqueiro e, o mais importante, ninguém dormia: rapazes, moças, pais e até pessoas mais velhas ficavam conversando, aguardando o horário de saída do desfile, marcado para as 5 horas em ponto. Não havia violência; o brincar era o mote do evento.
À frente, a bandinha de sopro executava o hino à Senhora Santana, enquanto muitos entoavam: “Salve Senhora Santana, Nossa Excelsa Padroeira...”, demonstrando que, em meio à alegria e descontração popular, estava afirmado o respeito à Santa Padroeira e que tudo se resumia em uma manifestação de fé. Ao percorrer a Rua Araújo Pinho, os alegres manifestantes desfrutavam da decoração instalada, e havia o espocar de fogos de artifício. Da Praça da Matriz (hoje Catedral de Santana), depois de arregimentar mais grupos oriundos de outros bairros, o Bando Anunciador cumpria o itinerário previsto, percorrendo a Avenida Senhor dos Passos até a Praça Fróes da Mota, fazendo o retorno pelo mesmo roteiro até a Matriz. Era a indicação precisa de que, a partir dali, começaria o período das novenas.
A Festa em louvor à Senhora Santana originalmente ocorria no mês de julho, no dia 26, de acordo com a liturgia, tendo sido transferida pela Igreja para o mês de janeiro. Não há registro de quando isso ocorreu, devido à intensidade das chuvas no mês de julho na região, o que causava o retraimento de muitos fiéis e, consequentemente, o esvaziamento dos festejos no seu tríduo inicial, depois ampliado para novenário. Anos depois, houve nova mudança, voltando o festejo para o mês de julho, como acontece atualmente, com enorme participação de fiéis de Feira de Santana e região.
Ainda em relação à parte profana ou folclórica da festa, como preferem alguns, por conta de uma decisão do Bispo Dom Silvério Albuquerque na década de 1980, a participação do Bando Anunciador e a realização da Levagem da Lenha, outro ato de enorme simbolismo marcando a época em que não havia iluminação artificial ou elétrica na praça, foram extintos. Todavia, graças à decisão do então reitor da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), José Carlos Barreto, e de um grupo de alunos e professores da instituição, o evento foi resgatado e voltou a ser realizado a partir de 2009, após consulta e permissão do Arcebispo Dom Itamar Vian, já que o festejo havia sido proibido pela Igreja.
Nos últimos anos, a saída do Bando Anunciador tem-se constituído em um dos momentos marcantes da programação festiva, com uma participação de público tão grande que há quem classifique a saída do bando como “uma nova micareta”, até porque o evento tem características bastante similares, pela presença de grupos de mascarados, colombinas, rapazes com trajes femininos, outros trajados com camisas de times de futebol, palhaços, forrozeiros, enfim, uma interessante diversidade de tipos que garante a tradição contida no âmbito da manifestação.
Por Zadir Marques Porto
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