
Aos cinco anos de idade, ele já tocava em uma pequena gaita de boca. Aos sete, foi premiado e comprou um instrumento melhor. Aprendeu partitura com o pai, que era maestro, e encarou a música como profissão. Passados mais de 70 anos, ele continua fiel ao que gosta e sabe fazer. Zé Trindade, um músico por excelência, ou uma excelência como músico, surpreende pela sua permanente simplicidade a quem não conhece a rica história da sua existência.
Multi-instrumentista, com diploma universitário e prática didática, Zé Trindade (José Trindade dos Santos) é o que se pode dizer: um músico na extensão da palavra. Nasceu em Mairi, na época ainda com o topônimo de Monte Alegre, e até hoje não faz outra coisa: “Música é a minha vida. É o que eu gosto e sei fazer”, diz. Aos cinco anos de idade, dava os primeiros passos com um realejo (gaita de boca simples). Com o pai, maestro Raul Souza Santos, começou a estudar a arte musical.
No serviço de alto-falantes “A Voz do Povo”, instalado no centro da cidade, começou a se apresentar cantando sucessos de Nelson Gonçalves, Jorge Veiga e Bob Nelson (cantor/cowboy), e fazia sucesso. Em 1955, durante apresentação no Circo de Zé Bezerra, além de muitos aplausos e o reconhecimento popular, ganhou um prêmio em dinheiro de cinquenta mil réis (moeda da época). “Cantei Julia Sapeca, uma música muito popular então”, relata.
Com o prêmio, adquiriu uma gaita de boca de qualidade e começou a aprender partitura com o pai. Coroinha da Matriz de Monte Alegre, em 1957, Trindade foi levado pelo Cardeal da Silva para o Seminário Franciscano em João Pessoa, na Paraíba, e daí para o Seminário Mirim da mesma ordem religiosa na capital paraibana. Aprendeu a tocar piano, violão e instrumentos de sopro sem dificuldade pelo seu natural talento. Em 1960, retornando a Feira de Santana, onde já estivera, passou a integrar o cast da Rádio Cultura, que tinha sede na Rua Professor Geminiano Costa, ao lado do Feira Tênis Clube, que hoje é um portentoso estabelecimento da rede municipal de ensino.
Com Edinho (cavaquinho), João Andrade (violão), Cacau (bateria) e Toninho (violão sete cordas), ele fazia parte do grupo musical que tinha como apresentador o locutor/cantor Dourival Oliveira. Na época, as emissoras de rádio tinham seus grupos musicais para os programas de auditório e outros meramente musicais. Algumas grandes emissoras do Rio de Janeiro e São Paulo tinham orquestras próprias. Aos domingos, na Rádio Cultura, o auditório ficava superlotado, com os programas Brasil de Amanhã, comandado pela professora Alcina Dantas, e Turbilhão de Atrações, apresentado por Hiberlúcio Souza (Cacau).
Em 1962, Zé Trindade foi para São Paulo ingressar na Faculdade de Música da Universidade de São Paulo. Formado em música, regressou a esta cidade em 1969, formando o grupo musical The Feira Boys. Depois, veio o grupo Os Leopardos, contando com Mirinho (guitarra), Carlinhos Palitó (baixo), Ivo (bateria) e Zé Carlos (cantor). Durante oito meses, a banda tocou no coreto da Praça Bernardino Bahia, no Projeto Roda Viva.
Contratado pelo advogado Adessil Fernandes Guimarães, presidente do Feira Tênis Clube, o grupo Os Leopardos animou eventos dançantes do extinto ‘Aristocrático’. Levado pelo advogado José Falcão da Silva, que foi prefeito de Feira de Santana, também tocou na Euterpe Feirense. Cantores e grupos visitantes eram acompanhados pelos Os Leopardos. No auge do sucesso, Zé Trindade recebeu convite formal da Gravadora Phillips. “Lafayette, da CBS, era o maior nome no país tocando órgão. Gravou LPs solo além de acompanhar os artistas de maior sucesso da época. A Phillips queria concorrer com ele e me convidou para isso. Eu seria, na Phillips, o que Lafayette era na CBS, mas Adessil foi contra e eu terminei ficando aqui”, diz Trindade, que, em 1978, deixou o grupo Os Leopardos, passando a tocar em várias bandas.
Assim, esteve em Brumado, Itabuna e outras cidades do Nordeste, como Aracaju. Mas a rápida passagem prevista pela capital de Sergipe resultou em 15 anos de trabalho ali. Muito bem recebido pelo público, Zé Trindade radicou-se no vizinho estado, só voltando a Feira de Santana em 2010. Aqui, integrou a banda Bolacha com Tubaína, criada pelo saudoso médico Outran Borges. O curioso nome do grupo surgiu, conforme Trindade, porque “um dos integrantes tinha por hábito, antes dos ensaios, ir até um bar tomar uma tubaína com bolacha fofa”.
Durante oito anos, ele foi professor de música do Centro Universitário de Cultura e Arte (CUCA). Chegando aos 81 anos de idade e mais de 70 dedicados à música, José Trindade dos Santos não se arrepende do caminho percorrido e quer continuar. Apesar de tocar diversos instrumentos e gostar da música romântica (MPB), a exemplo de A Viagem, de Paulo César e J. Aquino, sua música preferida é “Feira da Mangáia”, composição de Sivuca. Fã dos ritmos nordestinos, Trindade mantém um trio de forró autêntico: triângulo, zabumba e sanfona. Uma bela sanfona Scandelli de 120 baixos marca a sua presença no trio.
Desligado de futebol e outras formas de divertimento, José Trindade vive da música e para a música, dedicando especial atenção à sanfona. “A sanfona fica colada no meu coração. Parece que somos uma coisa só”. Ao contrário dele, que começou muito cedo, apenas o filho Rodrigo, que tem outra atividade profissional, demonstra algum interesse pela música, fazendo apresentações em Salvador.
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Foto: Divulgação – Arquivo ZMP




